foto: Fred Matos
a arvore envelheceu naquela primavera
e as palavras
caídas dos seus braços cansados
desenharam no chão as histórias antigas
que as avós nos contavam quando anoitecia
e as sombras dos candeeiros criavam ilusões
nas paredes caiadas
nas telhas manchadas
de limo
de fumo
de sonhos.
depois que os galhos queimaram na fogueira
e o aroma das suas lágrimas perfumaram os primeiros dias do verão
íamos à arvore como a uma oráculo
para ouvir o vento
o sabiá-laranjeira
a juriti
o uirapuru
o tiatã
naqueles idos
caminhávamos silenciosamente
pé ante pé para não assustar os preás
bicho arisco que matávamos com espingarda soca-soca
e tia caçula
que nunca se casou
pois tinha por destino cuidar dos pais
guisava a caça e nos servia em pratos esmaltados
a arvore envelheceu naquela primavera
fui para a cidade
deslumbrei-me com os anúncios de neon
com o trottoir das mulheres de saias curtas
saltos altos
excesso de maquiagem
com a alegria do álcool
com o barulho dos motores
a arvore envelheceu naquela primavera
e com ela a minha inocência
irremediavelmente perdida
quando me deixei iludir
por esta coisa
denominada
vida
Fred Matos
6/12/2008
9 comentários:
Que lindo esse poema Fred...
Me emocionou porque trouxe a recordação de um tempo lindo da minha vida, que envelheceu junto da Árvore.
A foto também é perfeita...
Parabéns por esse maravilhoso dom!
Abraço pra vc!
Fred belo poema
um daqueles que eu queria ter escrito
beleza e nostalgia
abraço
PS ficarei ausente por poucos dias
retirar a vesicula e volto logo pra te ler
Desfolhaste na árvore a tua subida ao estatuto de "homem" com as suas escolhas mas tb com as suas rejeições...
Obrigado, Fabi, me deixa contente que o poema tenha emocionado você.
Abraços
Minha vesícula já foi pro saco, Iosif. Acho que sua ausência não será maior que um ou dois dias, ainda assim sentirei a sua ausência.
Abração
É esta a intenção do poema, Helena.
Obrigado pela visita, leitura e comentário.
Beijos
através da poesia vão se revelando as peças do quebra-cabeças que forma o poeta. neste a informação da sua infância de menino do interior. assim acaba se desmontando a sua teoria de que o poema não é reflexo dos sentimentos do poeta.
Eu não sou do interior, Maurício. Nasci e me criei em Salvador. Este poema, portanto, não fala da minha infância, e sim da infância de um eu poético imaginário: é ficção.
Obrigado pela visita, leitura e comentário.
Abraços
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