quarta-feira, novembro 5

dever cumprido


ilustração: Foto de Mário Cravo Neto


enquanto os abutres bicam meus olhos,
deus e o diabo disputam a minha alma,
os parentes meu par de alpercatas
a mulher que amei os meus panos

saio da vida como entrei: por engano
fui criado jogado às baratas
num buraco coberto por palmas
em todos os pêlos piolhos

um dia quebrei os ferrolhos
tornei-me vil poeta e pirata
criei um universo fabuloso
de palavras ossos e sangue

rios de ouro prata diamantes
desaguaram nos meus bolsos
e enriqueceram as amantes
que gostam de coisas bonitas

fui o provedor das parasitas
das aflitas o tranqüilizante
agora sou somente a comida
das espécies rapinantes

é por isso que sigo rindo
com a consciência do dever cumprido
o sol nasce no meu umbigo
e se finda quando me findo


Fred Matos

2 comentários:

Anônimo disse...

Retribuo o seu abraço, que foi recebido com muito carinho e nostalgia.

Vejo que não sou só eu que amo meu cão.

Ótima sua foto da Recoleta, muito significativo o por-do-sol da vida. Quando estive lá (na Recoleta) conheci (os restos de) Olegario Victor Andrade. Um bom poeta (ele mora logo à direita de quem entra).

Parece que você também não tem escrito muito. Eu só faço agora poesia visual (leia-se: fotografia). Mas tenho uma pequena coleção de poemas sobre fotografia (que consolo).

Avoé, poeta querido.

Fred Matos disse...

Minha produção poética recente é parca e porca, amigo Ole.
Quanto à fotografia, é um hobbie, que o alto custo me fez abandonar após o nascimento dos filhos, mas que retomei com o advento da máquina digital.
Você, eu sei, é um bom fotografo e um bom poeta. Espero que continue, que escreva.
Espero que possamos retomar os dialogos interrompidos pelas circunstancias.
Abraço forte.

pesquisar nas horas e horas e meias