foto: Dorothea Lange - "Depression"
por uma poética de vísceras expostas
abdico do meu tempo
abdico de enquadrar-me
nas correntes contemporâneas
abdico do novo pelo novo
do modismo
do formalismo fácil
do verso piada
da emoção contida na medida do bom senso
de todas as coisas que também tenho feito
e onde não me encontro íntegro
por uma poética de vísceras expostas
abdico de heróis
de musas
de deuses
de filosofias
abdico da minha dor mesquinha
quando digo sou
e quando digo eu
não sou eu quem sou
sou a espécie humana
e suas contradições
sou a mãe que reza a barriga do filho
para que não morra de fome
sou o político que cortou as verbas sociais
para alimentar a usura dos capitais
sou o general
senhor da morte
que na retaguarda contabiliza mortos e feridos
brincando de mover soldados de chumbo
sou o desempregado que mendiga ou rouba
sou o desesperançado do amanhã
sou o predador das florestas
sou o assassino de mendigos e índios
sou o violador de crianças
sou o que polui praias
rios
nascentes
sou o que
a preço vil
escraviza seus semelhantes
e ufana-se benemérito
tudo o que é divino me é estranho
e, do que é humano, tanto me é medonho,
que, ensimesmado, tenho vivido na loucura niilista,
onde suponho a semente da ressurreição
Fred Matos
por uma poética de vísceras expostas
abdico do meu tempo
abdico de enquadrar-me
nas correntes contemporâneas
abdico do novo pelo novo
do modismo
do formalismo fácil
do verso piada
da emoção contida na medida do bom senso
de todas as coisas que também tenho feito
e onde não me encontro íntegro
por uma poética de vísceras expostas
abdico de heróis
de musas
de deuses
de filosofias
abdico da minha dor mesquinha
quando digo sou
e quando digo eu
não sou eu quem sou
sou a espécie humana
e suas contradições
sou a mãe que reza a barriga do filho
para que não morra de fome
sou o político que cortou as verbas sociais
para alimentar a usura dos capitais
sou o general
senhor da morte
que na retaguarda contabiliza mortos e feridos
brincando de mover soldados de chumbo
sou o desempregado que mendiga ou rouba
sou o desesperançado do amanhã
sou o predador das florestas
sou o assassino de mendigos e índios
sou o violador de crianças
sou o que polui praias
rios
nascentes
sou o que
a preço vil
escraviza seus semelhantes
e ufana-se benemérito
tudo o que é divino me é estranho
e, do que é humano, tanto me é medonho,
que, ensimesmado, tenho vivido na loucura niilista,
onde suponho a semente da ressurreição
Fred Matos
12 comentários:
Oi Fred
Não acho o niilismo uma loucura tão grande assim e apesar disso, é muito difícil livrar-se totalmente da hipocresia e das mentiras convencionais da nossa sociedade.
Mas a extrema sinceridade pode nos tornar muito solitários.
Muito bom este poema.
beijos
Rossana
Espero que a sua sinceridade nunca a torne solitária, Rossana.
Por outro lado: é melhor ficamos sós se o preço da companhia é não podermos ser sinceros.
Ótima semana.
Agradeço-lhe a visita, leitura e comentário.
Beijos
hola Freud, muy interesante tu blog, me gustó mucho esta visita.
Ventanas-janelas, abiertas-abertas a nuevos-novos sentidos poeticos, aqui me teneis
gracias
Olá, Marcela. Fico contente que tenha vindo, comentado e se tornado acompanhante do blog.
Ótima semana.
Beijos
Belo, verdadeiro e contemporâneo!
Sou muito criticada pelas verdades que exponho.
Identifiquei-me com esse poema e
"quando digo sou
e quando digo eu
não sou eu quem sou",
Linda esta parte, onde o ser humano escritor e poeta cede lugar
àquilo que o incomoda.
Parabéns, Fred!
Beijos
Mirse
Mirse,
Obviamente que é impossível o total alheamento do indivíduo na sua obra, mas creio que é preciso que ele tenha capacidade de dar voz às vozes que não são suas, mas que ele conhece, ou que intui, ou que pensa conhecer, ou mesmo que crie.
Veja-se, por exemplo, este trecho da letra da música "Fado Tropical", de Chico, no qual ele dá voz a um torturador:
"Sabe, no fundo eu sou um sentimental
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo ( além da sífilis, é claro)
Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar
Meu coração fecha os olhos e sinceramente chora..."
"Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto
De tal maneira que, depois de feito
Desencontrado, eu mesmo me contesto
Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intenção e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito
Me assombra a súbita impressão de incesto
Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadora à proa
Mas meu peito se desabotoa
E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa
Pois que senão o coração perdoa"
Mais uma vez, agradeço-lhe a visita, leitura e comentário.
Beijos
fortíssimo, bravo!
poema-lança, muito bom =)
bjos
Obrigado, Mercedes.
Fico contente por você gostar.
Beijos
Fred,
pra vc tbém uma ótima semana.
Beijos.
Obrigado, Juliana.
Deixou-me contente a sua visita, leitura e comentário
Beijos
'sou o que
a preço vil
escraviza seus semelhantes
e ufana-se benemérito'.
Renúncias... Todas em favor da verdade, sempre.
Poema forte e incisivo. E lindo.
E também um louvor à música de Dolores Duran, magnífica.
Bj
tais
Obrigado, Tais.
Deixaram-me muito contente os seus comentários.
Ótimo domingo
Beijos
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