Mudança é o terceiro conto de “Historias de Gabriel Medrano”, que, dedicada a Jorge D’Urbano Viau, é a segunda parte, de três, do livro “La otra orilla”.
As outras partes são "Plagios y traducciones" e "Prolegómenos a la Astronomía".
As traduções dos contos de Cortázar publicados no blog estão nos seguintes links:
De "Plagios y traduciones":
1. O filho do Vampiro
2. As mãos que crescem
3. Telefonema, Delia
4. A profunda siesta de Remi
5. Puzzle
De "Historias de Gabriel Medrano":
1. Retorno da noite
2. Bruxa
Foto: Manuel Álvarez Bravo
Mudança
Julio Cortázar
Tradução: Fred Matos
a partir do texto publicado nas páginas 73 a 80 de “Cuentos Completos/1” Decimoquinta reimprésión: junio de 2007, Editora Alfaguara – Buenos Aires – AR
Bah, se não fosse mais que o escritório, mas a viagem de volta agora que as pessoas têm que fazer fila para subir nos veículos e dentro dos carros elétricos permanece e estanca o mesmo ar de isolamento sem tempo de renovar-se, espécie de tapioca esbranquiçada que se respira e se expele: um asco. Com que alívio Raimundo Velloz desce do 97 e permanece no abrigo tocando os bolsos por fora com gesto de assaltado, de quem teve que pagar de repente uma conta e medita um pouco sobre a mudança no orçamento, como existem dois bilhetes de dez em vez de um de cem. É noite, anoitece cedo em junho. Pensa em seu sofá da sala, a xícara de café que Maria prepara tão quente, as pantufas com forro macio de barriga de guanaco (1) E o boletim da BBC às dez.
O escritório o cansa, dobra-o, enclausura-o como um porco-espinho contra tudo que não seja repouso depois do horário obrigatório. Ferrovias do Estado, seu escritório de Contabilidade... O limite do dever acaba às sete, não antes, não depois. Seu descanso começa às oito e quinze quando ele toca a campainha e ouve os passos familiares abafados ainda pela porta, em seguida as saudações e alguma pergunta e o sofá. Cinco anos de Contabilidade - contudo era jovem -, dez anos - contudo não era velho -, quinze anos em setembro, ao vigésimo segundo dia de setembro às onze da manhã. Boa folha de serviços, quatro promoções - e ele sobe agora, como ilustrando por fora o fio do pensamento, a escada do edifício - Nada que censurar-se, um prêmio de cinco mil pesos na loteria de Tucumán (2), o terreninho em Salsipuedes (3), assinante de El Hogar, amigo das crianças e não demasiado nostálgico de sua solteirice. Tem a sua mãe, a sua avó, a sua irmã. O sofá, o café, BBC. Não é pouco, quantos outros... E já está no segundo piso e a senhora de Peláez - sim é a senhora de Peláez, porque habitualmente transforma-se em maison de beauté e é o escândalo do bairro - saúda-o no átrio e ela lhe parece levemente mais jovem, coisa incrível.
"O Universo", pensa Raimundo Velloz, "que absurdo!" A unidade patranha da metafísica (Ele é graduado da Nacional Central). Não há um universo, existem milhões e milhões um dentro do outro e dentro de cada um outro e dentro de cada outro cinco, dez, quatorze universos variados e diferentes. Ele gosta das séries concêntricas de pensamentos, colunas de conceitos em conotações crescentes e decrescentes. Faz parte do grão de café, a cafeteira que o contém, a cozinha que contém a cafeteira, a casa que contém a cozinha, a maçã que contém... E se pode seguir pelas extremidades das imagens, pelo grão de café que envolve mil universos, e o universo do homem que é um universo dentro de quem sabe quantos universos, que talvez - e se lembra de haver lido - é somente um pedacinho da sola do sapato de um menino cósmico que joga em um jardim (cujas flores seriam naturalmente as estrelas). O jardim faz parte de um país que faz parte de um universo que é um pedacinho de dente de rato apanhado em uma ratoeira posta sobre a mesa de um sótão em uma casa de subúrbio. O subúrbio faz parte... Um pedacinho de qualquer coisa mas sempre um pedacinho, e a magnitude é uma ilusão que quase dá lástima.
E o sofá.
Maria abre a porta antes que ele toque a campainha. Ela oferece a face branquíssima que às vezes exibe duas finas veias como de aquário, Raimundo as beija e nota que a face não é tão suave e macia, tem por um segundo a impressão de que já beijou a outra face, ele que não sabe de faces e somente as calcula nos filmes e algumas vezes dormindo depois de haver abusado de patê de fígado. Maria o contempla com ar discreto e irritado.
- Demorastes mais que outras vezes, são oito e vinte
- O elétrico. Acho que ficou muito tempo parado em Once.
- Ah. Vovó estava inquieta.
- Ah.
Ouve a porta fechar-se atrás dele, coloca o chapéu e o guarda-chuvas nos cabides do corredor, vai à sala de jantar onde estão sua mãe e sua avó acabando de pôr a mesa. Sem dizê-lo (porque esse vestido está visivelmente usado e apenas por distração podia não reparar nele antes) se aproxima de sua mãe e beija-a. Que doce serenidade, uma sensação correspondendo exatamente àquela que por hábito pretende e espera. Face um pouco áspera (porque sua mãe depila as bochechas, é natural) sabor de pêssego e um débil aroma de cartas, uma fita rosa. Tão somente o vestido... Mas a jovial ameaça do dedo da avó o leva a ela, apóia as mãos em seus ombros fragilíssimos - porém se são tão frágeis, como sente-os resistir e amortecer a pressão moderada das suas mãos? - e a beija na testa cinderela e sutil cuja pele é apenas uma levíssima tela protegendo o osso inimaginável, surdo.
- Preocupou-se comigo? Atrasei-me apenas cinco minutos.
- Não, pensei que o ônibus havia se atrasado.
Raimundo vai à sua cadeira e apóia os cotovelos sobre a mesa. Não se lembra de lavar as mãos como de costume; curioso que Maria não o lembre, ela que tem idéias fixas sobre profilaxias e advinha contaminações nos passageiros do elétrico. Lembrou que sua avó tinha acabado de confundir o elétrico com um ônibus, ele não toma ônibus nunca e já deveriam sabê-lo. Salvo que haja ouvido ônibus e na realidade se trate do elétrico 97.
Salvo que em realidade se trate do mesmo quadro e que a luz da luminária, dando-lhe com raros reflexos no vidro, lhe mude esta noite os lábios e os torne grossos e um pouco verdes. Desde o sofá se tem uma clara visão do retrato do tio Horácio, e Raimundo não recorda haver-lhe visto nunca esses lábios e aquela mão com um lenço pendurado aberto, porque na realidade o retrato do tio Horácio tem as mãos no bolso; apenas um reflexo diferente da luminária da sala pode fingir essa mão branca e esses lábios quase verdes, e também que todo o ar do retrato é de uma mulher e não do tio Horácio.
Comentários de Atalaya, da BBC. Nada melhor que estes comentários com o comichão quente do café que Maria lhe entrega de trás do sofá. Raimundo o recebe agradecido, seus pés vagam amplamente nas pantufas confortáveis e todo ele está cômodo e acomodado, mas talvez um pouco menos que em outras noites, que as outras noites da casa. Alguém canta na cozinha a canção que sua mãe cantava enquanto enxugava os pratos. É a mesma canção - Rosas de Picardia, raramente Caminito - e a mesma maneira de cantar de sua mãe, somente a voz mais rouca e grave, algum arrefecimento ao aproximar-se à tarde para olhar a praça desde a varanda.
- Vamos, diga a mamãe que tome aspirina e abrigue a garganta.
- Mas se não tem nada - rosna Maria que lê o jornal no sofá -. Tio Lucas veio esta tarde e a encontrou esplêndida.
Deixa a xícara sobre o pires e olha lentamente a sua irmã. Você está brincando, sua mãe não tem senão irmãos já mortos. Agora se esconde por trás do jornal; melhor seguir a corrente e ganhar-lhe em esperteza.
- É uma pena que tio Lucas não seja médico. Assim sua opinião teria valor.
- Não é médico mas sabe muito - diz-lhe a voz serena de Maria, e suas mãos que a Raimundo parecem maiores que as de Maria agitam levemente as páginas do jornal.
- Me dá a impressão de que está afônica. E vovó, não se deitou?
- Oh, ela se deita tarde, você sabe. Ainda tecerá um bom lote de linhas de tricô.
Segue a piada e Raimundo entende que seria deselegante estragar o muito que Maria está se divertindo. Como quando eram crianças e se divertiam imaginando-se grandes, casados, com filhos e encargos importantes. Dias e dias fazendo-se perguntas sobre os respectivas casas, os cônjuges, a saúde de Raulito e Marucha... Até que um dia sobreveio o esquecimento e voltaram para uma infância sem problemas. Curioso - até um pouco triste - essa ressurreição em Maria das antigas farsas; como se alguma vez a vovó houvesse sabido tecer. Agora está olhando a porta e parece esperar algo. Garota estranha, agora penteia o cabelo recolhido e o oxigena, e a campainha chama em uma hora em que nunca chamou a campainha da casa.
- Quem diabos pode ser? - murmura Raimundo.
Maria se levantou e já está junto à porta quando vira a cabeça para olhá-lo.
- Meu Deus você está esquisito! É a porteira, naturalmente.
Não tão naturalmente, porque é inaudito que a porteira suba a essa hora. Maria recebe umas cartas e a chave da caixa de correio, fecha a porta com indiferença e olha uma a uma as cartas inclinando-se para a lâmpada, até quase tocar a cabeça de Raimundo com as mãos.
- Todas para mamãe - diz decepcionada - O Bebê não me escreveu... Mas que espere carta minha, ah, que espere.
O vestido da mãe desaparece em parte sob um avental de cozinha que justamente começa a remover quando entra na sala. Tem as mãos avermelhadas pela água quente, sorri satisfeita e cansada. Recebe o maço de cartas e as perde em um grande bolso do qual sai uma espécie de laço rosa muito bonito mas que a Raimundo não parece adequado para um bolso; como um pescoço deslocado ao local do bolso. E no pescoço? Muito simples, o gênero termina liso sem mais que uma bainha um pouco franzida. Raimundo, que se está perguntando a quem Maria chama de Bebê, pensa que sua mãe conhece de vestidos e lhe sorri quando passa junto dele.
- Cansado?
- Não, como sempre. Esta noite não há notícias interessantes.
- Ouçamos música.
- Está bem.
Move o dial, espera, escolhe, deixa. Onde está sua mãe? Onde se meteu Maria? Somente a avó passa devagar, se reclina no sofá - ela que deveria ir dormir cedo como mandou o doutor Rios - e o observa atenta.
- Você tem um horário de trabalho muito longo, filho. Se nota na cara.
- O horário de sempre, vovó.
- Sim, mas muito longo. Que música está tocando?
- Não sei, talvez desde Nova York; um jazz. Eu tiro, se quiser.
- Não, eu gosto muito; é muito boa esta orquestra.
O hábito, pensa Raimundo. Até mesmo as velhas gerações aceitam finalmente o que até o dia anterior - aquela mesma hora - lhes parecia abominável, música para cães, castigo do inferno. O surpreende quão forte que está sua avó e por nada do mundo a mortificaria sugerindo-lhe que fosse deitar; sim esta noite tinha decidido que fazer sua vontade é sinal de boa saúde e lucidez. Nem mesmo aceita de si mesmo um comentário quando a vê inclinar-se até uma bolsa pendurada no sofá e retira um tecido preto, agulhas, olhando tudo com um profundo e absorto ar de conhecedora. Por que assombrar-se? Os costumes da casa mudaram sem que ele notasse; tantas horas de escritório, absorvido noite e dia com os problemas da Contadoria... Se sente alienado, distante dos seus, pensa que haviam passado semanas em que foi um mero autômato chegando de noite, pondo-se de pantufas, escutando a BBC e adormecendo no sofá. E entretanto sua mãe cortava o vestido, Maria se amigava com o Bebê, a avó aprendeu a tricotar. Por que assombrar-se? Além de haver estado tão distante e ser tão diferente do que deveria ser, mostra-se tão mau filho e mau irmão. A vida tem essas coisas e não se pode tomar de ânimo leve o escritório da Ferrovias do Estado. Ao fim e ao cabo se algo muda na casa a ele não tem por que afetar-se pessoalmente; não é possível que todos estejam dependendo da sua vontade. E logo que as mudanças são simples detalhes, uma mudança na luz da luminária que torna diferente o retrato de tio Horácio, um amigo de sua irmã, a porteira que resolve trazer a correspondência vespertina, um bolso raro de sua mãe, sua avó mais vigorosa e sem esses ombros mirrados e fragilíssimos de antes. Detalhes, coisas que acontecem em uma casa.
- Lúcia - diz a voz de sua mãe (sim, está afônica), desde o quarto.
- Estou indo, mamãe - responde sem surpresa a voz de Maria.
Finalmente deixou de querer pensar - todos já dormiam - e foi deitar-se. Ele gostava da luz do quarto, era mais fraca e doce para seus olhos machucados pelas colunas de cifras. Entrou no pijama sem que percebesse os movimentos mecânicos que o incorporaram ao seu corpo; se deitou de costas e apagou a luz.
Não havia querido vê-las. Quando foram a ele e lhe desejaram boa noite inclinando-se sobre o sofá, fechou os olhos com um remoto sentimento de impossibilidade e aceitou os três beijos, os três boa noite, os três jogos de passos que se distanciavam rumo aos quartos. Em seguida desligou o rádio e quis pensar; agora estava mentindo e não queria pensar. Entre ambos momentos lhe pareceu compreender remotamente que não compreendia nada; só compreendia precisamente as idéias mais estúpidas. Por exemplo: “Como todos os departamentos são iguais, tenho...” Nem sequer chegou ao fim da idéia. Também esta, menos estúpida: “Não será que estou começando a...?” E então, como um resumo da sua conduta habitual: “Talvez amanhã...”. Então estava mentindo, como se o sono pudesse interpor-se e fechar um ciclo de onde algo estava se desorganizando e movendo-se de um modo que não se concebe. Tudo voltaria a estar bem ao amanhecer. Ao amanhecer tudo voltaria a ficar bem.
Provavelmente dormiu, mas era difícil para Raimundo distinguir entre as recordações dos seus pensamentos de semi-sonhos e seus sonhos. Talvez tenha se levantado em alguma hora da noite (mas isso ele pensou muito mais tarde enquanto copiava torpemente uma ata no grande livro que lhe deram no escritório dos Correios e Telégrafos da Nação) e andado pela casa sem saber exatamente para quê, mas seguro de que era necessário e que se o fez foi para combater a insônia. Primeiro foi à sala e acendeu a lâmpada para olhar entre as penumbras da parede do fundo o retrato do tio Horacio. Haviam-no mudado, ali havia uma mulher de mãos penduradas e lábios finos, quase verdes por capricho do pintor. Lembrou que Maria não gostava muito do retrato de tio Horácio e que uma vez havia falado em tirá-lo. Mas ele não conhecia essa mulher maligna e rígida; essa mulher não era da sua família.
Uma respiração espessa vinha do quarto de sua avó. Quem sabe se Raimundo foi até lá, mas ele se via entrando no quarto e observando - o fraco reflexo do estúdio - o rosto apoiado no travesseiro como um perfil de moeda sobre uma felpa numismática. Longas tranças caiam sobre o travesseiro, tranças negras e espessas. O perfil estava em sombras e só inclinando-se muito Raimundo poderia distinguir a avó. Mas as tranças negras, e, além disso, o tamanho do ombro poderoso, e, em seguida, o volume da respiração. Possivelmente voltou dali para a sala de jantar e parou um pouco para escutar o alento de Maria e sua mãe, que dormiam na mesma peça. Não entrou, já não podia entrar em outro dormitório, era até difícil voltar para o seu, fechar a porta, correr o ferrolho - tão mofado de não corrê-lo nunca -, pular na cama de costas e apagar a luz. Quem sabe se andou tanto pela casa; às vezes sonha que anda pela casa e na realidade não faz mais que dar voltas na cama, soluçando repentinamente sob imensa tristeza, e repetindo nomes, e vendo rostos, e calculando estaturas, e o Bebe que não escreve.
De manhã roçaram a lingüeta e Raimundo se endireitou recordando que havia fechado o ferrolho, uma idiotice que lhe valeria intermináveis piadas de Maria. Como havia posto o pijama saltou da cama e correu para abrir. Lúcia entrou sorrindo com a bandeja do café-da-manhã e se sentou ao pé da cama; não parecia surpresa de que ele tenha corrido o ferrolho e ele também não ficou surpreso que ela não tivesse estranhado.
- Pensei que você já havia levantado. Você dormiu e vai chegar tarde.
- Daqui até as doze.
- Mas como você entra às dez... - comenta Lúcia olhando-o com um olhar distante e surpreso. É uma moça loura e alta, tem pele morena que cai esplendidamente com todas as louras. Mistura o café com leite, tampa o açúcar e sai. Raimundo vê a saía branca, uma blusa fina levantada nos seios jovens, a rodilha pressurosa de tocada matinal. Acha que fez bem em passar o ferrolho? Não lhe ocorre que isso talvez seja demais. Então Lúcia volta a aparecer trazendo-lhe uma carta, que estende desde a porta com um sorriso simpático e sai. Senhor Jorge Romero, rua e número. Tudo bem, salvo o nome, e porém o nome tem de estar certo pois Lúcia trouxe a carta e a entregou com um sorriso. Menos absurdo do que podia acreditar, só que em vez de Raimundo Velloz, Jorge Romero; e dentro um convite para um baile e cumprimentos da própria C.D.
Ele sente agora como um peso nos ombros, na base da língua, na nuca; como se o laço dos sapatos não acabassem nunca e o nó da gravata fosse uma tarefa longa e sem sentido.
- Jorge, você vai chegar tarde.
Sua mãe - mas é verdade que está afônica -. Vai chegar tarde, Jorge. No entanto, até às doze... Melhor sair já, voltar à realidade, à contabilidade, à planilha interrompida ontem. Café, um cigarro, a planilha, universo sólido. Melhor ir-se já sem despedir-se. Ir-se já, e sem despedir-se.
Chegou furtivo ao estúdio ao qual entrou pela porta da direita como se antes não tivesse entrado no estúdio pelo corredor do fundo. Mas é a mesma coisa, agora não se importa por onde se entra e é tal sua indiferença que nem sequer olha o retrato da mulher que parece se assombrar com a olhada que ele lhe nega. Quando está a dois metros da porta, toca a campainha. Não sabe o que fazer, já vem Luisa correndo da cozinha , espanador em punho, o afasta com um empurrão e uma risada feliz.
- Fora do meu caminho, Jorge vil!
Fica de lado, vê abrir-se a porta. Quase sem surpresa descobre Maria vestida de rua que o contempla enquanto Luisa lhe estende a mão e a faz entrar.
- Finalmente vai conhecer o homem da casa! Graças a que hoje se levantou tarde... Meu irmão Jorge, a senhorita Maria Velloz, minha professora de francês, você sabe...
Ela lhe entende a mão com um gesto mecânico e necessário de saudação. Raimundo espera um instante, espera que ocorra o que deve ocorrer, mas como sua irmã continua com a mão estendida e nada acontece, esticou sua direita e ao fazê-lo lhe custa menos do que tinha pensado. Repentinamente lhe parece que está bem, seria estúpido gritar que ela é Maria e que... Somente pensa que poderiam ter-lhe dito; pensa mas sem sentir. Não o sente para nada, somente um pensamento como tantos que um tem. Então, quem sabe se o havia pensado. Ao contrário, algo nasce que o conforta e o alegra de que lhe tenham apresentado a senhorita Maria Velloz. Se um não conhece a alguém, é justo que se o apresentem.
1945
Notas do Tradutor:
(1) O guanaco, tal como a lhama, é um mamífero ruminante da América do Sul, da família dos camelídeos. Tem, porém, pelagem mais curta. Seu habitat é em altitudes próximas dos 4 mil metros, na Cordilheira dos Andes, sobretudo no Peru.
(2) Tucumán - Província do noroeste argentino.
(3) Salsipuedes - Aldeia de montanha, situado na 670 acima do nível do mar e localizado na encosta oriental das Sierras Chicas a apenas 34 km. ao norte da capital da Província de Córdoba, Argentina.
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